Quantas vezes você já ouviu, ou quem sabe disse: “Quase ninguém abriu a câmera, e os que abriram estavam com uma cara péssima”; “A equipe está desmotivada”; “Fulano não veio, não está se sentindo bem”; “Vamos ter que abrir uma nova posição, Ciclano vai sair”; “Beltrano disse que não aguenta mais e pediu para sair”; “Fulano está afastado, crise de ansiedade”; “Ciclano saiu, foi burnout”; “Beltrano está afastado, parece que é depressão”.
Essas são frases comuns no dia a dia de quem trabalha com equipes e, no mundo jurídico, a situação não é diferente. É fato que a questão mundial que vivemos, a pandemia da COVID-19, fez emergir situações relacionadas à saúde mental no trabalho, que há muito já nos rondavam, mas que estavam ainda submersas.
Em uma pesquisa da Universidade de São Paulo (USP)[1], em 2021, o Brasil liderou o número de casos, entre os 11 países pesquisados, com altos níveis de ansiedade e depressão durante a pandemia. E é nesse cenário que vamos falar de estigmas relacionados à saúde mental no ambiente de trabalho.
O termo estigma nos remete à identificação de características valoradas negativamente e que expõem uma ou mais pessoas ao desvalor. Não é surpresa, portanto, que o estigma de questões relacionadas à saúde mental esteja diretamente relacionado à subnotificação de casos de transtornos de ansiedade e depressão; bem como à piora desses quadros ante a incapacidade de colegas de trabalho e líderes de conviver e lidar com tais situações.
O medo de não ser aceito, de sofrer preconceito e discriminação por parte do empregador e de colegas de trabalho; bem como o medo de ser demitido, implica a omissão do diagnóstico e limita as possíveis ações para a manutenção de relacionamentos no ambiente de trabalho e, para alguns, impossibilita a sua permanência na atividade.
Eis o paradoxo: é justamente quando a pessoa está em sua condição mais vulnerável que o estigma a impede de pedir ajuda, por medo. Muitos funcionários com algum quadro adverso de saúde mental evitam um tratamento porque não querem que as pessoas saibam de seu quadro adverso de saúde.
O momento que vivemos atualmente, essa transição para a vida pós-pandemia, é ideal para empresas e escritórios agirem. Entender, priorizar e planejar a saúde mental dos funcionários no pós-pandemia precisa ser parte da estratégia de todo empregador no retorno para o ambiente de trabalho.
Um primeiro passo é mudar a percepção do que são os transtornos e distúrbios relacionados à saúde mental, reduzindo estigmas, preconceitos e, ao mesmo tempo, trazendo segurança e integração das pessoas que se encontram em sofrimento. Isso, obviamente, não deve ser feito por imposição, mas por meio da educação. Programas e treinamento de conhecimento sobre saúde mental para funcionários e treinamento de líderes e gerentes para reconhecer sinais de estresse, ansiedade e burnout são alguns caminhos.
Compreender e propagar a ideia de que questões relacionadas à saúde mental são tratáveis assim como qualquer outro quadro médico adverso. Promover uma cultura psicologicamente segura, com espaço para compartilhamento de questões pessoais, dificuldades e situações relacionadas à saúde mental.
Não há dúvidas de que priorizar o bem-estar mental é o caminho para manter a alta performance sem aumentar o turnover, em outras palavras, aumentar a satisfação e a produtividade da equipe, diminuindo prejuízos com afastamentos e demissões.
[1] Disponível em: <http://www5.each.usp.br/noticias/professor-da-each-e-entrevistado-no-jornal-nacional-sobre-pesquisa-que-levantou-niveis-de-ansiedade-e-depressao-durante-a-pandemia/>, acesso em 7 de julho de 2022.